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quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Alucinação

Este é o último post de 2010. Agradeço a você que no vem acompanhando o blog nesses dois meses de existência. Obrigado pelos comentários e sugestões, isso só tem me ajudado a melhorar cada vez mais. Espero que goste dessa última estória do ano. Em 2011 prometo continuar postando novidades. 

Feliz ano novo, muito sucesso, paz e prosperidade. 


 Agora leia a "Alucinação".     

      -Oh, meu amor. Você não imagina o quanto eu senti sua falta. –Ela dizia com um brilho no olhar.

     -Eu também sofro quando não estou contigo. O tempo, só para me maltratar, passa vagarosamente. É como se me obrigasse a viver a eternidade sem ti. –Os olhar dele correspondia.

     -Mas, felizmente, felizmente estamos juntos novamente. Deixemos de lamentar o passado. Agora que estou contigo tudo o que quero é me entrelaçar em teus braços e beijar teus lábios. Esqueçamos o mundo. Esqueçamos tudo.

     -Que assim seja. Sabia que esse momento chegaria. Ainda que meu céu se envolva em trevas, sempre resta uma estrela de esperança que brilha pelo nosso amor.

     -Adoro tuas palavras. Sempre és tão romântico naquilo que dizes. Não bastasse tua doce presença, ainda tenho o deleite de te ouvir trovar em nome de nosso sentimento. És perfeito.

     -A perfeição não existe minha amada. Jamais serei perfeito. Sempre haverá alguém que julgará minhas palavras diferentemente da forma como julgas. Mas, não me importo, se tiver de tentar ser perfeito que minha perfeição seja aquela que te agrada o coração.

     -Não entendo. Como podem censurar-nos? Como podem evitar que nosso amor se concretize? Porque insistem em nos distanciar? Porque insistem em tentar envenenar pela distância meu sentimento por ti?

     -Amor meu, as perguntas são muitas, porém todas caem frente a uma resposta: inveja. As pessoas são egoístas demais. Um amor como o nosso incomoda. Todos anseiam um amor verdadeiro para si, porém quando não o encontram, sentem-se injustiçados e desejam que ninguém encontre.

     -O que sinto por ti é mais forte que tudo. Basta pronunciar o teu nome para que meu coração se encha de alegria. E em momentos como este, em que compartilhamos do mesmo ar, sinto-me afortunada. Ah, como te amo.

     -Não! Fuja minha amada! Eles estão vindo. Corra antes que seja tarde. Querem nos separar novamente. Não deixe. Não me deixe.

     -Jamais vou te deixar... – Diz ela antes desmaiar nos braços do enfermeiro, que rapidamente lhe aplicara um sedativo.

     Ela havia ficado apenas alguns minutos sem sua medicação. Mas, foi o suficiente para que, novamente, os sintomas da esquizofrenia se manifestassem. Estava novamente tendo uma alucinação com o noivo. Este falecera há cinco anos. Ela jamais superou a perda.

     Sem conseguir esquecer o amado, a infeliz desenvolveu a doença. Desde então vivia em um manicômio sedada por fortes medicamentos. Sem eles ela voltava a ter alucinações. Por meio destas mantinha a chama de um amor atrapalhado por uma fatalidade do destino. A loucura dava vida ao amor.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Acaso - Final

     Embora não fosse um ávido leitor, sabia que era preciso ler pelo menos um livro por ano. Nem que fosse o “Best Seller” do momento, só para ter assunto em uma possível conversa. Fui até uma livraria. Caminharia até o vendedor, perguntaria o livro mais vendido do mês, o compraria e sairia. Era o roteiro de sempre. Mas, uma capa de um livro chamou minha atenção e fui até ele.

     Como apenas observar não bastava, peguei-o nas mãos e fiquei contemplando a imagem da bela mulher que o ilustrava. Foi quando uma voz suave falou: “Nossa, um homem que gosta de romances. Coisa rara de se ver”. Imediatamente, virei para responder, mas faltaram-me as palavras. A mulher conseguia ser mais linda que a voz.

     Meio que balbuciando mantive o assunto com ela, comecei falando da meia dúzia de livros que já havia lido em toda a minha vida, mas tomando cuidado, é claro, para parecer um amante literário. Fiquei impressionado com o interesse dela sobre tudo o que eu falava.

     Convidei-a para um café. Ela aceitou. Fiquei nervoso. Jurava que ela iria recusar. Mas o que mais me assustava era saber que meu nível de leitura só me garantia mais meia hora de papo. Deveria então usar de artifícios para mudar o rumo da conversa. E consegui. Bastou perguntar da vida dela e tivemos assunto para a tarde toda.

     Fiquei encantado. Seu nome era Ângela. Era linda e inteligente. Contou-me que havia mudado para a cidade há pouco tempo. Peguei seu telefone e dois dias depois nos encontramos novamente. E o encanto aumentava. Após alguns encontros pedi-a em namoro. E, para minha alegria, ela aceitou. Nunca imaginei que um livro poderia me trazer tanta sorte. Estávamos apaixonados e eu já não conseguia me ver sem ela. Minha relação de dois meses atrás já havia ficado no passado. Eu sequer havia comentado com ela.

     Quando completamos três meses de namoro decidimos comemorar com um a festa: pedi que ela convidasse os amigos para que eu os conhecesse. Ela então organizou um almoço. Seria perfeito. Definitivamente eu queria conhecer as pessoas que a cercavam, afinal, agora eu fazia parte da vida daquela mulher maravilhosa. Queria que todos soubessem.

     No dia marcado fui até a casa dela. Surpreendi-me pela quantidade de carros. Definitivamente ela tinha muitos amigos. Assim que bati a porta, ela abriu com um enorme sorriso. Aquele sorriso das mulheres quando querem dizer alguma coisa: “Amor, você não vai adivinhar. Minha irmã chegou de viajem e veio almoçar conosco. Estar ansiosa para te conhecer. Seja gentil com ela, há poucos meses ela terminou um relacionamento e está tentando superar.”

     Em meio a minha ingenuidade, apenas consegui dizer: “Pode deixar, serei o mais gentil possível. E fico contente por poder conhec...”. Não tive tempo de terminar. Ela chamou a irmã. Quando a moça se virou, a surpresa: era minha ex. Percebi no rosto dela que compartilhava da mesma sensação que eu, porém, seu olhar denotava certa raiva.

     Ela caminhou até nós me encarando. Fomos apresentados formalmente. Era impossível saber quem era o melhor ator, afinal, fingimos tão bem que nunca havíamos nos visto. Uma amiga chamou Ângela, que nos deixou a sós dizendo para conversarmos um pouco. Carla falava comigo de um modo que era possível perceber a mágoa, por eu ter superado nosso término relativamente rápido, e o ódio pela superação ter se dado com a irmã dela.

     Eu não sabia o que fazer. A cada palavra que Carla dizia, eu percebia que seria difícil continuar com aquele relacionamento. Ela não deixaria. Minha única reação foi deixá-la falando sozinha e sair da casa. Fiquei um tempo pensando sobre o que acontecera. Como a vida havia brincado comigo: tinha me apaixonado pela irmã da mulher que um dia amei. O que fazer?

     Mas, agora eu amava Ângela. Eu merecia viver aquele sentimento. Seria injusto simplesmente sair da vida dela. Injusto para ambos. Após alguns minutos tomei minha resolução. Entrei na casa novamente. Chamei Carla e falei:  "Sei que você vai fazer de tudo para que meu relacionamento dê errado com sua irmã, assim como o nosso. Porém, não ligo. Fique a vontade. Eu estou sentindo algo diferente por ela e não vai ser você quem vai atrapalhar."

     Ela simplesmente me olhou por alguns segundos. E disse que aprovava minha decisão. Demorei um pouco para acreditar. Ela então me disse que o importante era a felicidade da irmã. Mas que se eu fizesse algo de errado, teria de enfrente a fúria de duas mulheres. E quanto ao nosso antigo relacionamento, deveria ficar no passado. Seria nosso segredo.

     E assim as coisas seguiram. Hoje continuo com Ângela. Carla tornou-se uma grande amiga, mas continua solteira. Estou feliz. Percebi que não posso ir contra os rumos que a vida toma. E assim, hoje sigo sendo cunhado da ex-namorada e namorado da ex-cunhada.  


terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Acaso - Parte 1

     Completávamos seis meses de namoro naquele dia. Tempo suficiente, segundo Carla, para que eu pudesse conhecer melhor a família dela. Os pais moravam em outro estado. A irmã morava em uma cidade próxima e estava na cidade passando alguns dias. Logo, a ocasião perfeita para que eu a conhecesse. Marcou, então, um jantar. Na verdade, eu bem sabia que Carla queria a aprovação da irmã para confirmar se deveríamos seguir em frente, porém, não me importava.

     Desde cedo ela havia começado a me alertar sobre como a noite deveria ser. Confesso que ouvia muito pouco do que ela falava. Pra ser sincero não lembro nada. Talvez por isso nossa relação dava tão certo: o papel dela era falar; o meu, escutar – pelo menos fingir- e ao final dizer “entendo amor”. Recomendo a fórmula a qualquer homem. É infalível. Todos sabem que uma mulher sempre quer um homem para escutar o que ela não pode falar para as amigas. Isso por que, geralmente, é sobre as próprias amigas que elas falam. Mas, deixemos isso de lado.
     
     O combinado foi o seguinte: eu sairia do trabalho; vestiria-me impecavelmente; iria buscá-la e depois encontraríamos a irmã dela no restaurante do hotel onde ela estava hospedada. Juro que pensei que seria simples assim. Mas não foi. Vou logo adiantando que a culpa não foi minha, então, não me julguem.

     Fiz tudo conforme o combinado. Usei até uma camisa nova que estava guardando para uma ocasião especial. Porém, na parte dela é que as coisas se enrolaram. Quando cheguei a casa dela na hora marcada ela ainda estava se arrumando. Não era nenhuma novidade, mas, dadas as recomendações que fui forçado a aturar durante todo o dia, me senti no direito de reclamar.

     Ela entrou no carro com as costumeiras perguntas: “demorei?”, “estou bonita?”. Fui simplesmente monossilábico: “sim e sim”. Foi a gota d’água. Não me perguntem por que, mas, depois da minha resposta, o estresse tomou conta da mulher. Iniciou-se uma DR ali mesmo, a caminho do restaurante. Como sempre, eu escutava e tentava contornar as coisas, mas o tom de desabafo de tudo que ela dizia fez com que eu começasse a falar também.

     Quando parei o carro em frente ao hotel, ela saiu do carro com lágrimas nos olhos. Disse-me que eu era insensível, que não a procurasse mais. Enfim, senti que tudo o que ela havia guardado durante aqueles seis meses acabou por sair naqueles dez minutos de percurso. Até o carro ficara mais pesado depois de tantas palavras.

     Fui para casa. No dia seguinte tentei ligar para ela. Como não me atendeu, não liguei mais. Embora gostasse dela, tinha acima de qualquer coisa meu orgulho, e não passaria por cima dele por ela. Ela também não me ligou. Percebi que a vida deveria seguir. Foi difícil no começo, afinal, depois de seis meses se acostumar com as idiossincrasias do outro é inevitável.

     Aos poucos fui voltando à vida de antes. Os amigos me ajudaram muito nisso. Futebol, barzinho, balada. Tudo isso fazia parte da minha rotina novamente. Não estava disposto a abrir mão disso tão cedo. Mas, o futuro é imprevisível. Em uma tarde tudo mudaria.


Selos

Quero repassar o selo "Escritor da Alma", recentemente recebido, para alguns amigos blogueiros que considero que o merecem tanto quanto eu. Eles são:


Raissa Bahia, autora do blog "Entreletras" (http://raissabahia.blogspot.com/) grande amiga, incentivadora, irmã...enfim...por isso e por escrever coisas com as quais me identifico.

Gustavo Ferreira, autor do blog "Etc & Tal" (http://etcetaloblog.blogspot.com/) meu brother, cobaia dos meu textos e, principalmente, um cara que me incentiva a continuar escrevendo. Valeu amigo.

sábado, 18 de dezembro de 2010

Somni

     E lá estava ela, mais uma vez, diante da minha cama. A imagem diante que eu via era a da perfeição. Curvas generosamente esculpidas pelo bom Deus, as quais faziam meus olhos ostentarem um brilho de êxtase. Contemplá-la por si só já era um delírio. Poderia viver eternamente diante daquela imagem.

     O movimento de seus cabelos era quase hipnótico, bem como seu olhar fixo em meus olhos. Os rubros lábios em conjunto com seu nariz afilado davam ao seu rosto aquela harmonia de ninfa grega que excita e incita.

     Como de costume me perdi imerso em tal contemplação, até o momento em que ela caminha até mim, e eu desperto, vagarosamente, acompanhando o sutil balançar de seus quadris, que contrastam com a afinada cintura. Então ela se deita sobre mim e com seu beijo quente me traz de volta ao mundo.

     Sinto o calor de seu corpo se misturar ao meu, como duas chamas que se unem para arder com mais intensidade. Não consigo conter minhas mãos, que anseiam por percorrer cada milímetro daquele corpo, tateando sutilmente sua veludosa pele, que a este momento tem os poros eriçados por seguidos arrepios.

     O desejo é latente. A vontade é a dona do momento. Amamos-nos. E por alguns instantes, temos a sensação de que o mundo inexiste. As imagens desaparecem, os sons se calam, tudo que existe somos nós envoltos em nossas carícias, ao som de sussurros e leves gemidos.

     Pouco a pouco, vamos nos afinando para compor a sinfonia perfeita. Os acordes se sobrepõem, se entrelaçam. A cada toque uma melodia, a cada beijo se mostra a sintonia. E vamos atingindo o ápice do prazer juntos, até o desfecho: o último suspiro de êxtase de nossa ópera amorosa. Eu então deito, e fico a contemplá-la até que o sono venha. Adormeço e ela é ultima imagem que tenho.

     O sol se lança ao céu para trazer um novo dia. Sua luz, que penetra pela janela, me avisa que devo acordar. Abro os olhos e como de costume não a vejo. É sempre assim. Preparo-me para mais um dia de trabalho. Tomo um rápido café e saio.

     Durante o percurso, o engarrafamento da capital me concede um tempo para repassar na mente as imagens da noite passada. Relembro cada instante com prazer. Nem mesmo as buzinas constantes não conseguem me livrar de meu devaneio. Sigo assim por todo o caminho até chegar ao meu destino.

     Entro na firma e como de costume cumprimento os amigos e vou ao meu lugar. Então a vejo chegar. Ela está tão linda quanto na noite anterior, porém mais vestida. Ainda que a veja todos os dias, não entendo como ela consegue estar cada vez mais bela. Sigo a observando até a sala dela.

     Ela fica lá por algum tempo. Depois sai e vai buscar algo para beber. Levanto-me da mesa. Caminho em direção a ela. Vou dar-lhe um beijo, desejar-lhe bom dia e dizer que a noite anterior foi a mais incrível da minha vida.

     Enquanto vou seguindo pelo corredor, ela vem caminhando em minha direção. Como ela é linda. Então, ela passa por mim e como sempre, nem levanta o olhar. Simplesmente me ignora como se eu não existisse. Nem ao menos um bom dia.

     Eu paro e fico a observá-la até que ela entre novamente na sala. Frustrado por não ter feito o que queria. Angustiado por ter que contemplá-la diariamente sem que ela nem ao menos me dirija a palavra.

     Porém, o que me consola é saber que em meus sonhos eu a tenho. Saber que hoje à noite, mais uma vez, lá estará ela, diante da minha cama. Contemplarei mais uma vez seu corpo nu e nos amaremos. Pelo menos em meus sonhos, nos amaremos.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Loteria

     Vivia sozinho há cerca de quatro anos. Minha esposa falecera e como não tivemos filhos, fui obrigado a conviver com a solidão. Ainda que eu amasse a falecida, ser solitário não era nada bom. Porém, cidade pequena é fogo, por mais que eu tentasse as mulheres sempre me viam como o “viúvo da Joana”. Enfim, arranjar uma namorada era uma missão impossível e, infelizmente, eu estava a anos-luz de distância de ser um Tom Cruise.

     Durante esses anos minha vida se resumiu à: casa-trabalho-casa; casa-trabalho-boteco-casa; casa-trabalho-baralho-casa. Ou seja, eu não vivia, vegetava. A vida estava um verdadeiro tédio, porém o destino é ardiloso e saberia como mudar minha a situação.  Por um golpe de sorte acertei na loteria. O dinheiro era bom, daria para fazer algumas coisas.

     Mas, a lembrança do tédio pôs uma idéia em minha cabeça: sair daquela cidade. Iria para uma cidade vizinha, onde as mulheres não conheceriam o “viúvo da Joana”, mas sim o Almeida, o ricaço. E foi o que fiz. Vendi minha casa para o vizinho por alguns trocados e parti. Rumei para uma vida nova.

     Ao chegar à cidade iria procurar logo uma casa para comprar, porém, uma visão me impediu. Uma visão loira, alta, bem torneada, daquelas que transforma qualquer cristão em um tarado em potencial. O fato é que não pensei em mais nada. Segui a moça até que ela entrou em um lugar que me parecia um hotel.

     Julguei que ela devia trabalhar lá. Iria entrar e me aproximar, porém não estava com a indumentária adequada. Fui a um salão de beleza e fiz barba, cabelo e bigode. Em seguida fui à melhor loja da cidade e comprei um terno bonito. Troquei de roupa na loja e de lá mesmo rumei ao encontro da loira.

     Seria perfeito: o lugar parecia um hotel e era o que eu precisava, sem falar que a loira estava lá. Adentrei ao recinto e imediatamente fui recebido pela loira. Porém, para minha surpresa seus trajes eram diferentes dos que havia visto. A moça trajava uma espécie de lingerie que me tirou o ar. Realmente, ela era funcionária do estabelecimento. Mas não era um hotel. Era um prostíbulo (cabaré para os íntimos).

     Diante daquela recepção não pensei duas vezes: hospedei-me no local. Em menos de meia hora eu era conhecido como Dr. Almeida e tinha amizade com todas as “funcionárias” do local. Conheci inclusive a gerente que fez uma promoção para a hospedagem. Banquei uma festa e comecei meu caso de amor com a loira. Enfim, a vida de tédio não existia mais nem em lembranças.

     O nome da loira era Alice. Devia ter metade da minha idade, mas quem se importa. Nosso amor era lindo. Não raro passeávamos pela cidade de mãos dadas. Eu a levava às lojas e fazia suas vontades. Não me importava em gastar, ainda possuía muito dinheiro. Todos olhavam para mim com o olhar típico de inveja. Mas, eu não ligava, estava feliz como nunca havia estado.

     No “hotel”, todas as “funcionárias” eram simpáticas comigo. Viviam a me oferecer carícias gratuitas em troca de atenção bem remunerada. Porém, Alice as repelia. Sentia tantos ciúmes de mim que eu ficava até encabulado. Até a gerente não podia conversar comigo além do essencial.

     E assim passaram-se os dias. Fiz algumas reformas no lugar e todas as sextas comemorávamos todos pela minha vida feliz com meu amor e meus novos amigos. Até o dia em que fui até o banco e, depois de digitar a senha, dinheiro algum saiu do caixa eletrônico. Fui então até o gerente para reclamar e ele me informou que eu não só não tinha mais dinheiro como ainda devia ao banco.

     Fiquei desolado. Fui para “casa” e comuniquei à minha amada e meus amigos o que havia acontecido. Mal fechei a boca, a gerente mandou retirarem minhas coisas do quarto. As “funcionárias” me olhavam diferente. Então Alice veio até mim e se despediu. Disse que nosso amor infelizmente teria que chegar ao fim. Fui gentilmente convidado a me retirar.

     Agora estou aqui. Sentado em um boteco e bebendo com os poucos trocados que me restam. Daqui posso ver o local que foi meu lar nos últimos meses. Lá está Alice, a mulher que me amou durante quatro meses, cento e cinqüenta mil duzentos reais e quarenta centavos.

     Poderia estar magoado, mas, quer saber, dane-se. Estou tranqüilo, pois tenho um plano. Há alguns minutos joguei na loteria de novo. Porém dessa vez o prêmio acumulou, vão pagar dois milhões. Então vou apenas esperar aqui bebendo minha cerveja. Amanhã vou ganhar na loteria e voltar para o meu lar, meus amigos e vou viver com minha amada pelo resto da minha vida. Ou quanto tempo o dinheiro durar. Vou ser feliz.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Do amor

     Desde muito cedo comecei a ouvir falar sobre um tal “amor”. Achava estranho o modo como as pessoas suspiravam por ele numa hora, mas poderiam cair em lágrimas por ele no segundo seguinte. Não entendia, por mais que tentasse como algo poderia ser tão contraditório e ainda assim ser o que tantos buscam.

     Devotei minha vida então a entender o significado de tal sentimento. No meio do caminho encontrei algumas mulheres que quiseram seguir comigo em minha odisséia. Mas não pelos mesmos motivos que eu. A maioria delas dizia que se eu estivesse com elas o amor iria aparecer cedo ou tarde e que eu não precisaria entendê-lo, mas sim senti-lo.

     Por mais que quisesse acreditar no que elas me falavam, minha busca tornou-se uma obsessão. Algo mais forte que eu. E nessa ânsia por buscar respostas racionais para algo que não se encaixa na racionalidade, fui me perdendo. A ponto de em um dado momento não saber mais que eu era, nem até onde iria para compreender o ato de amar.

     As mulheres que me acompanhavam não conseguiam se manter na busca. Entravam e saiam da minha vida rapidamente e sem conseguir, mesmo tentando de diversas formas, mudar muitas coisas em meus pensamentos. Algumas não fizeram muita diferença. Mas umas poucas deixaram saudades, o que tornou ainda mais difícil o caminho.

     Já estava bem próximo de desvendar a resposta que buscava quando Luana apareceu e me fez questionar toda uma vida. Não sei responder por que, mas ela me fazia esquecer, mais do que qualquer outra, de todas as minhas angústias, medos. Mais ainda, ela me fazia sentir protegido mesmo sendo tão frágil e delicada.

     Porém, percebi que isso de certa forma atrapalhava minha missão. Pensei que deveríamos parar para que eu pudesse continuar sozinho. Assim o faria, mas diante do olhar dela era sempre impossível dizer adeus. As palavras fugiam tão rápido quanto os motivos e a coragem diante daquela pequena de voz doce.

     Então, pouco a pouco fui percebendo o quão equivocado eu estava em querer encontrar respostas para o amor. Afinal, e depois que eu encontrasse o que seria da minha vida? Sem falar em todas aquelas que tive que magoar para permanecer nesse engano. Percebi então que o amor, mesmo sendo contraditório, invasivo, forte. E que por mais estranho que possa ser ele é o que todos buscam nessa vida.

     Luana me mostrou, aos poucos, que em minha procura era vã. Pois, quanto mais eu compreendia o amor, mais eu me distanciava dele. Que ao fim de tudo, eu iria ver que amor era tudo o que eu não tinha. Hoje já penso diferente. Tento esquecer toda essa paranóica mania de tentar compreender sentimentos. 

     Hoje eu apenas os vivo, na sua totalidade, como deve ser. E quanto ao amor, hoje ele faz parte da minha vida, porém quem está no centro de tudo hoje é Luana. Hoje não busco mais entender nada. Minha odisséia hoje é manter aquele sorriso e aquele brilho no olhar para sempre.  


quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Adeus

     Ouvi um barulho estrondoso e quando dei por mim estava aqui: atirado ao chão. Não sei de que lado veio, mas senti um peso na cabeça e perdi o equilíbrio rápido demais. Agora estou deitado, tudo o que consigo ver são as nuvens cortando lentamente o céu. Jamais havia reparado na forma delicada como elas se movem, dá uma sensação de paz.

     O chão outrora seco ficou úmido tão rapidamente. Sei que não é água, é o sangue que foge com pressa do meu corpo que morre. Minha pulsação, cada vez mais fraca, me diz que não terei muito que esperar, a hora derradeira se aproxima. Não há nada a ser feito, a mim resta aguardar até que minha vida tenha se esvaído por completo.

     A morte é a única certeza, mas, não imaginei que viria agora. Pensando bem, seria tolice pensar que a morte espera até a hora que nos convém. Lamento por meus sonhos. Pensei que os realizaria. Pelo menos alguns. Mas agora, não há mais porque sonhar. Minha vida se reduz a mais alguns minutos.

     Amigos. Nesses poucos anos tive alguns. Sinceros, verdadeiros, amigos. É uma pena ter que deixá-los. Lamentável não poder agradecê-los pela amizade que me devotaram. Sinto o mesmo pela minha família. Sempre estiveram comigo, poucas foram as vezes em que me senti só. Mas agora, ironicamente, não há ninguém aqui. Não há lágrima alguma para amenizar minha dor.

     Não sei o que fiz de errado para chegar a este momento. Pra ser sincero, não imagino quem possa ter ceifado minha vida. Talvez eu seja apenas mais uma vítima do acaso. Apenas mais um cuja existência é reduzida por obra do destino. A vida é curta. A minha está sendo. Quantas coisas perderei: o ápice da adolescência, a utopia do primeiro amor, a agonia do vestibular, a dádiva do primeiro filho.

     Enfim, é injusto privar-me a vida. Logo agora que comecei a sentir o real sabor da existência? Logo agora que faltam poucos dias para o meu 13º aniversário? Minha breve vida já passou diante de meus olhos inúmeras vezes nesses minutos. Já lembrei todos. Lembrei de tudo.

      Lembro de minha mãe, quanto ela me ama. Lembro de seu olhar de alegria ao me ver, de seu sorriso acolhedor, de sua voz calma. Calma. Calma como as nuvens que agora vejo. Não sei se é impressão, mas elas estão mais próximas. Sinto que se esticar um pouco o braço posso tocá-las. Mas, não sinto mais meus braços, pernas.

     De repente fiquei com sono. Minhas pálpebras pesam demais. Está ficando difícil pensar. O céu começa a se envolver de tons cada vez mais escuros. As nuvens estão se desfazendo lentamente diante dos meus olhos. Imagino o que está para acontecer. Devo agora apenas contemplar as ultimas imagens que se projetam em minha mente.

      É chegado o fim. É chegada a hora da despedida. Obrigado por me acompanhar, ainda que a distância, nesses últimos minutos. A você, recomendo que viva enquanto pode. A morte não espera. A morte. Talvez sejam dela esses olhos ásperos que vejo agora. Deve ser ela que me carrega no colo agora com suas gélidas mãos. Adeus. Ah, Deus!