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terça-feira, 29 de outubro de 2013

Mudança

Ele acendeu um cigarro e se sentou em uma cadeira posta junto à janela. Ficou então a observá-la arrumando a cama. Permaneceu em silêncio por alguns segundos. Por fim, deu uma tragada profunda e iniciou.


- Há algo de errado. – Afirmou.

- Errado? Com o quê? – Indagou surpresa, demonstrando muito mais interesse no cobertor que dobrava.

- Com o sexo.

- Foi ruim?

- Não. Mas também não foi bom.

- Como assim? – Perguntou, agora o olhando nos olhos.

- Não foi bom como costumava ser a dez anos atrás, quando nos conhecemos.

- Ah sim. Pois é... há dez anos éramos mais jovens. O tempo passou, as coisas mudaram. – Respondeu com certa ironia.

- Não. Você não está entendendo. Não foi esse tipo de mudança. Até pouco tempo eu podia sentir algo mais que prazer. Até pouco tempo, fazíamos amor. Hoje sinto que é só sexo, sem qualquer significado.

- Não sei por que você pensa isso. Ainda fazemos amor. Amo você tanto quanto antes.

- Desculpe, mas não é o que eu sinto. Tenho a sensação de que cedo ou tarde tudo vai acabar e eu serei pego de surpresa.

- Deixe de tolices. Você sabe que isso não vai acontecer.

- Então porque eu sinto esse vazio?

- Talvez você esteja esperando que eu seja algo que jamais poderei ser.

- Não é isso. Eu já me conformei com as coisas como elas são. É que... não sei...você às vezes parece distante.

- A vida não é mais tão simples. Você sabe disso. Temos problemas que às vezes tomam nossa atenção, mesmo quando não queremos. São contas a pagar, filhos a educar.

- Mas havíamos combinado que quando estivéssemos juntos esqueceríamos tudo.

- Eu sei, eu sei. Mas é que...

- Eu só quero que você se entregue a mim.

- Perdão. Tenho falhado com você. Prometo que não vai mais acontecer. É você quem eu amo, nunca esqueça isso.

- Também amo você. – Sorriu satisfeito.

- E então? Mais uma vez? – Perguntou ela com um olhar promíscuo.

- Sempre.

Os corpos se abraçaram e, assim que os lábios se tocaram, o barulho do motor de um carro, que se aproximava, pôde ser ouvido. Os dois se entreolharam e trocaram uma mensagem silenciosa. Apanharam as roupas jogadas ao chão rapidamente e começaram a se vestir. Ela agradeceu por ter arrumado a cama, não esperava que o marido chegasse tão cedo.

Ele a beijou uma última vez, subiu na cadeira onde outrora estivera sentado e pulou a janela. Caminhou pelo jardim envolto na escuridão da noite. Antes de pular o muro, olhou para trás. Através da janela, pode vê-la beijando o marido que acaba de chegar. Era um beijo caloroso, com paixão e saudade. Era daquilo que ele sentia falta. Não importava o que ela havia dito, estava vendo agora que, realmente, havia uma mudança: ela já não o amava; amava o próprio marido.

Uma lágrima correu lentamente por seu rosto: fora traído.




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