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domingo, 9 de outubro de 2011

Infame

     Rasgar-lhe as roupas não era suficiente para mostrar-lhe meu desejo. E eu a beijei, mordi seus lábios, pressionei-a contra a parede e tudo aquilo parecia excitá-la mais que a mim. Surpreendi-me, isso jamais acontecera. Podia sentir o sangue que pulsava por aquelas veias, indo em direção ao coração sobressaltado, que elevava aqueles seios a cada respiração. Os olhares de volúpia dela me guiavam pelas ruas de seu corpo. Os leves gemidos controlavam o ritmo de meus passos, ora apressados ora serenos.
     Foram meses de namoro até aquele momento. Esperei até o último instante porque a amava. Mas a tentação sempre esteve entre nós, atiçando-nos a cada beijo, a cada abraço mais caloroso. Por vezes resisti, reprimi meus desejos. Resistiria um pouco mais, mas ela já não compreendia minha relutância. E eu confesso que também já esboçava minhas fraquezas. Ela decidiu que seria hoje. Eu nada pude fazer. Como um homem poderia enfrentar uma vontade feroz que o persegue por dentro e por fora?
     Seria apenas uma visita costumeira, mas ela estava sozinha e quando dei por mim já estava entorpecido por aqueles lábios. Ela parecia em transe. Suas mãos corriam por meu corpo sem se preocupar com os rastros que as unhas deixavam. Ela jamais emanara tanto calor. O ardor daquela chama contagiante não encontrou qualquer resistência em mim. Então, inevitavelmente, “incendiamos”.
     Deitada sobre mim, ela mexia os quadris com violência sem sequer descolar os lábios dos meus. Eu podia sentir que ela estava tão desejosa quanto eu. Talvez mais. Ela gemia como se seu corpo fosse pequeno demais para conter tanto prazer. Ela agarrava os lençóis e mordia os lábios com força. Era como se tivesse dentro de si uma fera, há muito aprisionada, querendo libertar-se. Não havia nada daquela menina doce e calma de sempre. Era outra mulher, indomável, voraz.
     Entretanto, eu não partilhava daquele frenesi de prazer. E eu sabia bem o porquê. E tudo seguiria bem, até ela perceber. Porém, não havia como fingir um orgasmo. A princípio, ela sentiu-se incapaz, mas, a vontade de me satisfazer era maior que tudo. “Sou sua, faça comigo o que quiser”, disse-me. Palavras convidativas, desafiadoras. Talvez eu soubesse o desfecho daquilo, mas não ceder era impossível. Quem conseguiria?
     Ela não entendeu quando eu peguei aquele lenço e envolvi em seu pescoço. Mas percebeu que aquilo me excitava e embarcou na fantasia. No início eu apertava o lenço com calma, ela parecia gostar da breve asfixia. Porém, à medida que eu era dominado pelo prazer, perdia o controle sobre a força que exercia. Até o momento em que ela cravou as unhas em meus braços, uma tentativa desesperada de fazer-me cessar. Porém o clímax estava próximo, eu não iria parar.
     Ela já não tinha fôlego para falar ou gemer. Seu corpo já parecia desfalecer. Seus olhos já não brilhavam, aquela chama estava se extinguindo. O seu último suspiro de vida coincidiu com meu primeiro suspiro orgástico. Enfim eu estava satisfeito. Porém, uma vez mais, meu prazer viera acompanhado da tragédia. Sobre a cama jazia mais uma vítima de minha luxúria. A história se repetira como nas últimas duas vezes.
     Fugir me parecia a melhor opção. Recomeçar em outro lugar, viver outra vida. Porém, a história acabaria se repetindo. Mesmo porque, um homem pode fugir de tudo, menos das maldições que habitam sua essência. Decidi que me entregaria àqueles que têm por função zelar pelo “bem” da sociedade, afastando do convívio social todo aquele que haja em desacordo com as convenções hipócritas estabelecidas.
     Mas, como já havia lhes dito, eu amava aquela mulher. E não é o fato de ela estar morta que me faria amá-la – desejá-la - menos. Vamos, não façam essa expressão de espanto. Mesmo morta ela me deu tanto prazer quanto eu podia desejar. Aquele corpo frio roubava meu calor como se quisesse ressuscitar. Decerto dirão agora que sou infame. Mas, vos digo isto se resume a uma questão de preferências. Todos possuem gostos distintos, isso é o normal. Entretanto, culpam-me apenas porque o meu destoa daquilo que a maioria estabelece como sendo normal.
     Enfim, cá estou confessando meus crimes. Narraria os detalhes dos outros dois cometidos há algum tempo atrás, mas a memória não me deixaria ser tão fiel como fui agora ao contar o acontecido de uma hora atrás. Sei que serei preso pelo que fiz. E não ouso desejar que um dia seja perdoado. Mas, o que posso fazer se esta é minha natureza? Aceito ser condenado, mas somente se houver em suas prisões um modo de concertar uma essência que já nasceu “corrompida”.


Fonte Imagem: http://ima.dada.net/image/medium/273296.jpg

Um comentário:

  1. Sem brincadeira, tu consegues me dar uma rasteira em cada texto teu quando leio. SEMPRE!

    É um talento, rapaz!!! Segue.

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